A reportagem do Diário do Nordeste teve acesso ao documento, no qual constam movimentações milionárias que levaram às autoridades a identificar os suspeitos. O juiz da 11ª Vara da Justiça Federal do Ceará cita, tendo como base as investigações, 'valores astronômicos' da organização criminosa formada para "cometer estelionato e lavagem de dinheiro".
Juntos, os investigados teriam movimentado, pelo menos, R$ 1,3 bilhão a partir do "desconto indevido de mensalidades associativas em aposentadorias e benefícios do INSS sem o conhecimento ou autorização de seus beneficiários".
No Ceará, foram apreendidos veículos de luxo, como uma Ferrari e um Rollys-Royce, além de dezenas de sapatos avaliadas, cada par, em torno de R$ 40 mil.
O empresário Natjo de Lima Pinheiro é, segundo a Justiça Federal, "um dos principais gestores das associações investigadas, sendo um dos maiores envolvidos nas transações suspeitas relacionados aos valores astronômicos movimentos para associações, originados de valores obtidos através de milhares de descontos fraudulentos dos benefícios de aposentados pelo INSS, havendo grandes indícios que a operação das associações se dava em conjunto".
Natjo é proprietário de clínicas e laboratórios de saúde. Junto a ele está o nome da advogada Cecília Rodrigues Mota. Conforme as investigações, a dupla contava com 'testas de ferro' para as movimentações financeiras.
A reportagem apurou que pelo menos três carros de luxo foram recolhidos da garagem da casa do empresário. O imóvel é avaliado em, aproximadamente, R$ 27 milhões, sendo um dos mais caros e luxuosos do Ceará.
VIAGENS INTERNACIONAIS
De acordo com documentos obtidos pela reportagem, Cecília já empregou a esposa do empresário em seu escritório de advocacia "destinatário de altos valores oriundos dos descontos indevidos autorizados pelo INSS".
Cecília foi presidente de duas associações suspeitas de aplicar os golpes, a Associação dos Aposentados e Pensionistas Nacional (Aapen) e a Associação dos Aposentados e Pensionistas do Brasil (AAPB).
Já a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) – Secção Ceará informa que “já foi aberto um procedimento interno de verificação de conduta ética-disciplinar, além de outras providências. Por força da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil), no §2º do art. 72º, o andamento dos processos disciplinares no Tribunal de Ética e Disciplina (TED) é sigiloso, só tendo acesso às suas informações as partes, seus defensores e a autoridade judiciária competente”.
Consta também no documento que a advogada levava uma vida de luxo, tendo "três veículos de luxo adquiridos pela operadora do direito nos anos de 2023 e 2024, que anteriormente só ostentava um veículo popular sob sua propriedade".
Segundo a Polícia Federal, Cecília viajou 33 vezes em menos de um ano, com destinos como Dubai, Paris e Lisboa, e na companhia de outras pessoas ligadas ao esquema.
Natjo teria sido um destes acompanhantes em 15 ocasiões, tendo supostamente recebido R$ 400 mil em operações das empresas de Cecília.
Em uma viagem até Dubai, a dupla e outros dois amigos teriam transportado 31 malas, o que para a Polícia é "incomum para uma viagem internacional de 7 dias".
Ainda de acordo com a Justiça Federal, as operações suspeitas feitas pela advogada "denotam sua relevância como operadora financeira e uma das líderes da organização criminosa".
O Diário do Nordeste também apurou que Cecília Rodrigues Mota tem inscrições no Cadastro Nacional dos Advogados (CNA) nos estados do Ceará, Bahia, São Paulo e Distrito Federal.
EX-DEPUTADA GORETE PEREIRA
O nome da ex-deputada federal e fisioterapeuta Maria Gorete Pereira também é mencionado como investigada neste caso. Segundo a Justiça, ela "recebeu procuração da associação AAPEN para celebrar o Acordo de Cooperação Técnica com o INSS".
Assim, Gorete tinha 'amplos poderes'. Consta ainda na investigação que a ex-parlamentar movimentou quase R$ 245 mil em transações suspeitas, entre 2018 e 2023.
A reportagem procurou a ex-deputada, não reeleita desde 2018, mas não teve retorno até a publicação desta matéria.
OPERAÇÃO SEM DESCONTO
A Operação Sem Desconto foi deflagrada pela Polícia Federal (PF) e pela Controladoria Geral da União (CGU), no último dia 23 de abril, contra fraudes no INSS. As buscas ocorreram em 13 estados.
A Operação Sem Desconto foi deflagrada pela Polícia Federal (PF) e pela Controladoria Geral da União (CGU), no último dia 23 de abril, contra fraudes no INSS. As buscas ocorreram em 13 estados.
Das 11 associações alvos de mandados judiciais, conforme lista do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), a reportagem apurou que três instituições têm sedes em Fortaleza - sendo duas no bairro Aldeota e a outra, no Centro - e firmaram Acordo de Cooperação Técnica (ACT) com o INSS entre os anos de 2021 e 2023.
A AAPB é uma das entidades investigadas pela Controladoria Geral da União (CGU) em meio ao escândalo do INSS, em que associações representativas de aposentados e pensionistas cobraram R$ 6,3 bilhões de beneficiários sem a autorização dos mesmos.
No site "Reclame Aqui", a AAPB recebeu 540 reclamações. Nenhuma delas foi respondida na plataforma. As queixas são justamente sobre cobranças indevidas, que conforme os relatos começaram entre 2018 e 2025.
Nas redes sociais, a AAPB diz que "suas atividades foram suspensas por medida cautelar determinada pela Justiça Federal" e que colabora com as investigações.
A Associação também fala que sempre "obedeceu a legalidade, tendo apresentado toda a documentação pertinente para a obtenção do Acordo de Cooperação Técnica junto ao INSS".
Entidades investigadas pela CGU e ano da assinatura do acordo:Contag – 1994
Sindnapi – 2014
Ambec – 2017
Conafer – 2017
AAPB - 2021
AAPPS Universo – 2022
Unaspub – 2022
APDAP PREV (antiga Acolher) – 2022
ABCB/Amar Brasil – 2022
CAAP – 2022
AAPEN (antiga ABSP) – 2023
A PF e a CGU dizem que "de toda forma, os aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que identificarem desconto indevido de mensalidade associativa no extrato de pagamentos (contracheque) podem pedir a exclusão do débito de forma automática pelo aplicativo ou site 'Meu INSS'".
A PF e a CGU dizem que "de toda forma, os aposentados e pensionistas do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que identificarem desconto indevido de mensalidade associativa no extrato de pagamentos (contracheque) podem pedir a exclusão do débito de forma automática pelo aplicativo ou site 'Meu INSS'".
(Diário do Nordeste)