Por: Francisco Leopoldo Martins Filho
Advogado
Membro Efetivo da Comissão Eleitoral da OAB CE
Recentemente, o Crato foi eleito a terceira cidade com melhor qualidade de vida do Ceará por um instituto de pesquisa, o que, à primeira vista, parece ser motivo de orgulho. No entanto, ao confrontarmos essa classificação com o diagnóstico da economista Rita Fabiana Arrais, publicado pelo O POVO CBN Cariri, o contraste salta aos olhos e expõe uma profunda incongruência entre os indicadores utilizados nesses rankings e a realidade vivida pela população cratense.
Segundo Rita, há um empobrecimento crescente das famílias do Crato, evidenciado pelo fato de que há mais beneficiários do Bolsa Família do que trabalhadores com carteira assinada. Isso indica um cenário de vulnerabilidade social em larga escala, agravado por fatores estruturais como baixa escolaridade, falta de qualificação profissional, deficiência nos serviços de saúde e migração em busca de emprego.
Como, então, conciliar esse quadro com o título de "terceira melhor qualidade de vida do estado"? A resposta está na superficialidade de certos indicadores utilizados para avaliar qualidade de vida, que muitas vezes consideram apenas aspectos como infraestrutura urbana, IDH genérico ou indicadores ambientais, ignorando a desigualdade social, a precarização do trabalho e a realidade das periferias.
É preciso questionar: qualidade de vida para quem? Para o pequeno grupo que possui estabilidade econômica e acesso a serviços privados, a classificação pode até fazer sentido. Mas para as centenas de famílias dependentes de programas assistenciais, sem acesso digno à educação ou saúde, essa “qualidade” não passa de um dado estatístico vazio.
Essa disparidade entre a narrativa institucional e a realidade econômica da população revela o risco de decisões públicas e investimentos se basearem em premissas distorcidas. Sem um olhar mais atento aos indicadores sociais profundos — como emprego formal, renda média, mobilidade social e acesso real a direitos — qualquer classificação de qualidade de vida corre o risco de legitimar um status quo desigual.
O Crato não precisa de selos honoríficos. Precisa de políticas públicas que enfrentem de forma séria e estruturada os desafios da pobreza e da exclusão. Como bem defende a economista Rita Arrais, é urgente um estudo aprofundado das causas desse empobrecimento, para que o município possa, de fato, trilhar o caminho do desenvolvimento com justiça social.