terça-feira, 7 de outubro de 2025

Chapada em Chamas: a Tragédia Anunciada do Araripe

Flavio Pinto News


Por: Leopoldo Martins

Advogado

Membro Consultor da Comissão Especial Eleitoral da OAB Nacional

A cada ano, o mesmo roteiro se repete na Chapada do Araripe, primeira floresta nacional do Brasil: o fogo avança, a fumaça encobre o horizonte e o poder público assiste, mais uma vez, à devastação previsível. Não há surpresa alguma, apenas a confirmação da falta de interesse e de prioridade governamental diante de uma catástrofe que poderia ser evitada com planejamento, prevenção e estrutura adequada.

Enquanto o discurso oficial se limita a notas e promessas, a realidade do combate é de improviso e precariedade. O telefone de emergência do Corpo de Bombeiros, em diversos momentos, sequer funciona, transformando o socorro em uma aposta de sorte. Os equipamentos disponíveis são obsoletos, os veículos insuficientes e o número de servidores está muito aquém da necessidade de uma região que concentra vastas áreas de vegetação densa e relevo acidentado. A cada foco de incêndio, expõe-se o mesmo quadro: bravura individual enfrentando a omissão coletiva.

Falta uma política preventiva eficaz, articulada e contínua. As ações entre os órgãos ambientais e as corporações de combate a incêndio são frágeis e desintegradas, quando deveriam atuar em sintonia, trocando informações, mapeando áreas de risco e monitorando comportamentos irregulares. Em vez disso, predomina o remendo tardio, quando o fogo já consome o que a natureza levou séculos para construir.

A narrativa fácil tenta atribuir ao agronegócio a responsabilidade pela destruição, mas os fatos desmentem essa simplificação conveniente. O setor produtivo, que atua sob rigorosa legislação ambiental e adota técnicas modernas de manejo e cultivo, é justamente o que menos provoca queimadas na Chapada do Araripe. A origem dos incêndios criminosos está majoritariamente ligada a práticas agrícolas ultrapassadas, realizadas por pequenos produtores que, ao roçar o solo com métodos arcaicos, acabam provocando focos

incontroláveis de fogo nas encostas e no sopé da serra, comprometendo toda a vegetação da chapada.

O IBAMA, por sua vez, adota uma postura desigual. Exibe rigor e protagonismo na fiscalização e autuação do agronegócio formal, aquele que paga impostos, emprega mão de obra e cumpre as normas ambientais. Entretanto, age com benevolência diante dos agricultores que cultivam no sopé da Chapada — justamente o maior foco de início das queimadas que se alastram pela floresta. Falta equilíbrio, orientação técnica e ação preventiva efetiva. É urgente rever prioridades e substituir a política punitiva seletiva por estratégias de educação, assistência e prevenção ambiental.

A Chapada do Araripe não queima por fatalidade, mas por negligência. A cada temporada de estiagem, o desastre se anuncia com a mesma previsibilidade de um eclipse. E enquanto o Estado insiste em fechar os olhos, a floresta arde — não apenas em chamas, mas em indignação.

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